#COCO-RI-COCÓ: ESTRIPULIAS NO PAU DO POLEIRO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: SÁTIRA
Aquilo mesmo de: se for cantar de galo, seja galo
de grande porte, seja galo de longa espora, crina considerável e linda de
extasiar quem a observa de fora do galinheiro, seja galo de verdade, pois que
cocó-ri-cocó não faz galice, não faz gal-itude, nem a esboça o valor da forca
onde Judas perdeu as suas digníssimas botas, a mínima que tiver perderá com
distinção por vezes em menos de vinte e quatro anos, no máximo que durará será
mês ou dois, por não se sustentar, não haver quem, no reino dos homens de condutas
idôneas ou culturais, mesmo intelectuais, sábias, doutas que irá acreditar,
tecerá encômios apesar de hipócritas, não re-conhecerá apesar da falsidade e
farsa, não haverá única galinha ou franga, galinho ou franguinho que não vá
cocó-ricar, não vá alçar as asas, fazer estripulias no pau do poleiro, como se
fosse trapezista, mostrando o senso de riso e gargalhada, como os humanos fazem
quando alguém ostenta valores e no frigir das claras e gemas não há único,
caiu-se no ridículo, tornou-se objeto de escárnio, embora isso do riso não lhes
diga quaisquer mínimas, não estão tais humanos nas tintas, pois que nos tempos
atuais tais comportamentos e atitudes são valores, virtudes. Ouvi dizer que
alguns intelectuais e filósofos estão com a pena em mão escrevendo ensaios
sobre a importância das farsas, falsidades, hipocrisias, aparências para o
encontro do verdadeiro verbo do ser, alguns já estão famosos e eternos,
desfrutando os prazeres e volúpias da vida, aliás estão bem satisfeitos e
realizados, pois andam na contramão dos conservadorismos e preservadorismos.
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Pode-se ad-mitir, considerar que a única coisa que
o cocó-ri-cocó pode trazer de benefício e reconhecimento é a gal-idade, isto é,
a idade do galo, quando o cocó-ri-cocó começa a enfraquecer, diminuir,
mostrando que ele está ficando velho, doente, morrendo sob a presença dos
galinhos e galinhas, enfim vão ficar livres de sua prepotência, hora de ir para
a panela de ferro para o delicioso galo a molho pardo, quiabo com chuchu,
depois de algumas horas cozinhando, alegrando o domingão, saciando o desejo dos
mineirinhos, regando o delicioso bate-papo à mesa de causos e mais causos,
nunca deixando de contar a história de alguém que montado em seu alazão
atravessou os mares, levando o ouro para a lusitana terra de Camões, regado na
residência dos sem-condições de uma cachacinha da roça, dos que são poucochito
mais beneficiados financeiramente com um delicioso vinho de mercearia, dos
eminentemente beneficiados com uma champagne, servida em taça de cristal, com
todas as etiquetas.
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Cultura é cultura, não se discute, e quem de outras
culturas não aprecie os nossos pratos, especialmente o frango a molho pardo, pé
de porco com jiló, suã ou mocotó de boi com jurubeba, maxixe com costeleta de
porco, rabada com jurubeba?! - já estou com água na boca, adoro estes pratos.
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Afianço que os paulistanos são os primeiros a
adorá-los, embora sempre critiquem os mineiros, desde o “devagar e sempre”,
crendo eu ser manifestação de inveja e ciúme, pois esse devagar e sempre acaba
eternizando as coisas pelo seu nível de perfeição, a arte sublime e bela requer
tempo e muita labuta, tempo esse que faz doer todo o corpo, carne e osso, na
hora de espreguiçar, depois do sono profundo, na aurora do novo dia, o rápido e
ligeiro não deixa nem pegadas, rastros, efêmero e fugaz, sem nível algum de
perfeição, apenas que podem as coisas ser usadas por algum tempo, não sendo
apenas descartáveis, ao “trem” para nomear todas as coisas.
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Contaram-me, não posso afirmar com categoria haver
sido verdade, lenda, mentira, se bem que amplia muitas situações e
circunstâncias quotidianas vividas e experienciadas pelos homens, mostra de que
é capaz o homem, a que nível de arrogância e ridículo pode chegar, prepotência
e pernosticidade podem rebolar nos sapatinhos de salto de agulha de quinze
centímetros, como tudo é possível nesse velho mundo sem porteira e cancela, até
mesmo o re-verso ser o in-verso, vice-versa, o verso verdadeiro ser a emenda
que se tornou pior no poema ou soneto.
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Particularmente, conheço uma que ec-sis-emplifica
ou ec-sis-amplifica com perfeição isso de cocó-ri-cocó não fazer galice, aliás
a inspiração surgiu dela, agradeci cordial e espiritualmente aos astros e
cometas por ela, outra oportunidade de ser inédito nesse mundo de mesmidades em
todos os níveis, inclusive nas pás que lavram as litteris da novidade e
re-fazenda, e prometi aos dons e talentos que iria real-izar os sentimentos e
emoções que se me a-nunciaram, fazer ou construir cultura ou história é ser
inédito, a novidade se re-vele por vezes latente, por vezes manifesta,
dependendo da corrida do quotidiano e da história. Referir-me à coisa mesma,
servindo de linguagem e estilo nos trinques, não me pareceu interessante, não
despertaria os sensos de riso e galhofas outros tantos que o normal de meus
conterrâneos, que são mestres e doutores no riso das ostentações que caem qual
folhas secas das árvores, pitangas que apodrecem nas galhas e despecam-se com
solenidade, ouve-se a altissonância na Cochinchina.
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O galo habita o inconsciente dos homens, símbolo e
signo do poder e vaidade, explico-me, de madrugada o seu canto acorda quase a
cidade inteira, e quem não acordou ouve os comentários, mesmo em se tratando de
algumas piadas picantes com o famoso galináceo – aqui no Brasil, eles cantam
entre quatro e cinco e meia da manhã, não sei a que horas cantam na Alemanha,
em Hiroshima, no Vietnãm.
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Caseiro de uma rocinha em nosso município criou um
pinto que encontrou na estrada para a cidade, tornou-lhe galo de briga. Aos
domingos pegava a estrada a pé, não era longe, no trajeto cantando músicas de
Rio Negro e Solimões, sertanejos de sua paixão e amor, levando o Manesito para
a rinha. Voltava para a rocinha todo feliz, boa quantidade de dinheiro no
bolso, se nalgum dia da semana precisava vir à cidade, dava-se o luxo de comer
um self-service delicioso lá no Restaurante e Churrascaria Espaço Livre, do
Joãozinho, e não o famoso “p.f.” no botequim Flor do Sertão no Mercado
Municipal, que aliás não tem mais nada com a prefeitura, os proprietários das
lojinhas compraram o cômodo. Não havia galo que o vencesse, alguns morreram
para a tristeza e desconsolo de seus proprietários. Por mais que os seus rivais
fossem galos de porte, bravos, ainda havia algo neles que não atingia a potência
de Manesito. Fama, sucesso garantidos, lenda, história, pela diretoria da rinha
considerado um patrimônio, Patrimônio Galináceo e Cultural da Rinha São Jorge,
houve comentário passageiro, mas verdadeiro, que essa diretoria estava pensando
mesmo em conceder ao galo de briga Manesito medalha de honra ao mérito. O
caseiro a cada briga enchia-se de orgulho e lisonja.
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Alguém sentira bastante a perda de seu galo nas
esporas de Manesito, jurando por todos os santos e anjos, até mesmo por
Mefistófeles, que a morte de Totó não ficaria daquela maneira. Viajou para uma
cidade no sertão, lá pelos cantos e re-cantos de Pirapora, comprando por uma
quantia considerável o galo mais bravo e violento. A rinha ficou entupigaitada
de jogadores, as apostas foram altíssimas, na fantasia e imaginação férteis do
caseiro passara: “É hoje que vou lavar o galo”. Realmente aconteceu. Manesito
matou Totó em questão de meia de hora. Comentários de todas as espécies
surgiram, feitos pelos amigos e companheiros de Neófo. Manesito ganhou a briga
porque o juiz não deu qualquer intervalo na briga, um cheque rechonchudo fora
colocado debaixo da bandeja. Quem não sabe perder inventa desculpas as mais
escalabrosas para não sentir as dores da perda, para não servir de comentário
nos tanques de roupa pelas velhas, pelos homens de condutas idôneos, vencedores
em tudo na vida, fofoca de toda a comunidade. Manesito brigou dignamente, se
não fora dado intervalo é que não fora necessário, uma esporada fatal nocauteou
Totó. Não houve qualquer falcatrua do juiz.
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As críticas foram tão contundentes que o caseiro
decidiu afastar-se da rinha, ficaria algum tempo sem levar Manesito para
brigar, o que ganhara com a morte de Totó garantir-lhe-ia alguns meses de
liberdade financeira. Ademais, a fama e o sucesso de seu galo estavam
garantidas, com o afastamento iriam aumentar consideravelmente, tornar-se-ia
lenda, talvez até ganhasse uma medalha de patrimônio da Rinha São Jorge. O
número de presentes na rinha aos domingos diminuiu, mesmo os turistas deixaram
de ir lá, devido à ausência de Manesito. Alguns apostadores procuraram o
diretor, fizeram reunião, para discutirem como seria o retorno de Manesito,
como conversariam com o seu proprietário, que era cabeça-dura, nem o machado de
Lo Borges era capaz de lhe inspirar a mudar de opinião.
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O proprietário viajou pelo Nordeste em busca de um
galo de grande porte, o mais importante, com inúmeras medalhas suspensas na
amurada do galinheiro, o seu proprietário já havia comprado lá em Goiás uma
fazenda de sem-número de alqueires, verdadeira mansão, piscina, salão de
boliche, e outras cositas mais re-ferentes aos esportes dos bilionários.
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Após alguns poucos meses, disseram-me haver sido
dois, conseguiu o que mais desejava, custou-lhe o decúplo de Totó. Iria, com efeito,
mostrar que Manesito era como certos homens só batem nos fracos, em mulheres,
crianças, bêbados e mendigos, mas em homem de índole e raça não são capazes de
fazê-lo, mínimo sopro deste caem de costas duros e fedendo. Não se falou noutra
coisa na cidade senão na briga de Manesito e Cacá. Até a televisão local
noticiou. Sendo a rinha pequena para todos os que desejassem assistir ao grande
espetáculo, fora colocado um telão na praça principal para o evento ser
televisado. O jornal local noticiara que compareceram à praça mais de duas mil
pessoas, isto porque era o galo que garantia o nome, renome da cidade, era até
objeto de turismo, vários turistas, quando era anunciada briga importante de
Manesito, enchiam os hotéis, o comércio faturava alto nos sábados, a rinha
funcionava aos domingos. A comunidade sentia bem forte e presente em si que
qualquer outra cultura era inferior à sua, ela era o supra-sumo da humanidade,
devido ao galo Manesito.
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Em quaisquer filmes do velho faroeste está bem
nítido que não ec-siste o gatilho mais rápido, haverá um bandido mais rápido,
que colocará por terra até o mocinho.
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Chegara o dia de Manesito. Diante de Cacá, Manesito
era daqueles galos que querem mostrar ser o implacável, não há cocó-ri-cocó que
supere o seu. Em menos de quinze minutos Manesito estava estirado no chão,
mortinho da silva. Os presentes saíram da praça principal de cabeça baixa. O
que perpassou todas as mentes fora: “O que está acontecendo com a nossa
comunidade?”, isto porque a barraquinha de Santo Antônio naquele ano caíra
consideravelmente, no sábado e domingo do evento a praça das barraquinhas não cabia
de gente, vinte mil pessoas participavam da festança. Naquele ano se
compareceram duas mil pessoas pode-se considerar exagero. O movimento da
Exposição de Gado também caíra consideravelmente.
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E agora, José, que galo Manesito morreu, a
barraquinha de Santo Antônio diminuiu o número de turistas, a Exposição de Gado
caiu?
#riodejaneiro, 13 de fevereiro de 2020#
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