*E O RIO BEBIA A FLORESTA* - Manoel Ferreira
E o rio bebia a floresta. Silente surge à beira da floresta uma presa
sombria. Céu de estrelas pela noite espiritual.
Se me en-veredo pelas cositas, desemboco-me nas "tais", e nas
tais cositas vou-me fazendo, re-fazendo, tornando a fazer, vou seguindo a
estrada das tais, que não trans-formam a linguagem e o estilo de
estar-no-mundo, mas trans-literalizaram as experiências e vivências,
tornam-lhes espírito de sonhar a verdade, tornam-lhes alma de desejar, não o
absoluto, isto é quimera, o viver aberto aos horizontes re-versos da lareira da
contingência, esse picadeiro mais lindo e esplendoroso, onde os risos e
alegrias permanecem por sempre - neto de palhaço, sou, e com muito orgulho e
alegria, objeto de risadas e gargalhadas dos homens, e admirador da obra de
Gogol, aprendi a representar no picadeiro as graças de estar-no-mundo, nasci
sem razão, prolongo-me à busca do sorriso nos horizontes de lareira re-versa,
rio de mim mesmo, e morro de alegrias in-versas e trans-versas, olhando e
con-templando o uni-verso de in-finitudes sob a luz fosforescente das sensações
de ser, não-ser...
E o rio bebia a floresta. Buscava através do aparente o que aparecia,
através do disperso o que dispersava, e recolhê-lo no silêncio que dizia a
unidade. O devir haver-se-ia de constituir-se, como a ponte entre não-ser e ser
A vida é viver todas as coisas. Se não as vivemos, não se viveu,
estivemos nas sombras do mundo. Por vezes, a maior angústia é a suprema e
divina felicidade. E por vezes, se pensamos nas re-versas lareiras do
trilhar-os-caminhos-do-prazer e felicidade, é a maior desgraça, infortúnio... E
pensamos que somos os tais, se nos enveredarmos pelas cositas. Achamo-nos,
pomos óculos escuros, usamos chapéus, estufamos o peito, olhamos de esguelha
para a terra, e nada somos.
E enveredando-me pelas tais, desemboco-me nas cositas, e nos horizontes
belos, na beleza dos horizontes, no esplendido de Belo Horizonte, e descubro
entre emocionado, tirando os óculos escuros do rosto, con-templando à
distância, olhos rumos, agradecido por estar no mundo, entre os homens, as
coisas e os objetos, aprendendo sensibilizado a caminhada ora nos caminhos floridos
de florestas, ora nas estradas de pura poeira...
E o rio bebia a floresta. Não aguardei que a madura idade me convertesse
em flor, essa beleza, em terra, em cinza, em pó, em sombra, em nada. Por entre
os estatutos da terra e a conjuntura esconjurada dos deuses caminho. Ao
sobrepujar o lugar, a audácia me leva a favorecer o não-ser contra o ser.
Vida, vida, vida... E Clarice Lispector, minha amada e querida escritora
das horas em que a vida mostra suas perspectivas de dor e sofrimento, ipsis
litteris trans-literalizada de vida, diz que não a precisamos entender, sim
vivê-la. E estou vivendo agora as cositas das tais, as tais de cositas,
comungadas vão desembocar nos horizontes de lareira re-versa, quando sinto e
vivo o amor que compreende, vivencia, vive, entende... É a rosa da vida o amor
- dizendo assim, lugar-comum, mas sentir isso nas profundezas dos quês-da-vida,
hum... rum... ou rum... hum..., cositas da vida vida de cositas, vida de tais
cositas...cositas de tais vidas...
Poeta e escritor jamais serei, sou o homem imperfeito na vida, no
caminhar por entre o picadeiro da vida e a vida de todos os picadeiros...
E o rio bebia a floresta...
Manoel Ferreira.
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