**AMURADA DE DESERTOS E PEDRAS** - Manoel Ferreira
Toda a glória do mundo fica a cargo da luz que tudo
vê, que tudo ilumina. Até o amor, o sexo inusitado e excêntrico entre dois
namorados, é iluminado, em todos os seus pormenores de movimento, beijos,
línguas, posições pelo olho luminoso que tudo vê.
Que acabou com a noite? Não sei se já houve o fim
da noite, creio que não. Bem, ao menos no que concerne à minha sanidade mental,
posso afiançar que o olho luminoso que tudo vê não acabou com a noite. Se
“foi-é” intenção a ironia, cinismo com as estrelas que brilham intensamente
esta noite, consegui realizar a contento, servindo-me da estratégia do
questionamento, enfatizando até, desde este início, encontro-me entregue em
absoluto nos braços destes companheiros de jornada, sendo característica
principal.
Com as estrelas? De modo algum, brilham no céu,
está à vista de quem ousar levantar a cabeça, olhando-as diretamente, deixando
o seu brilho penetrar nas retinas. Quem sabe até pudessem estes homens enxergar
poucochinho mais o que realmente está acontecendo em suas cátedras,
escritórios, salões de arrasta-pés. Vejo-as brilhando. Tenho alguns graus de
miopia e estigmatismo, portanto, não me é dado que o brilho das estrelas
corrija estes males. Fosse assim, nenhuma ótica sobreviveria. É preciso que o
brilho das estrelas não corrija estes males da visão para que as óticas a cada
passo dado aumente o seu capital, a sua preferência por alguns clientes.
A possibilidade de eternidade para a vida? Se até
este nível, fora-me doado gratuitamente as estratégias da ironia e sarcasmo,
com esta indagação, se o olho luminoso que tudo vê acabou com a possibilidade
de eternidade para a vida, esvaeceu-se o engenho e arte da ironia, sarcasmo.
Tornou-se sério. Seria estúpido ridicularizar, dizendo que sim, aliás, isto era
inevitável, uma necessidade primordial no concernente à eternidade para a vida.
É necessário que exista, os homens não conseguem viver sem as quimeras,
fantasias, seria o sério nesta questão de ridicularizar.
Neste estilo e modo, penso assim: é necessário a
luta, o trabalho contínuo, para que os homens possam atingir esta tão cobiçada
glória, os ideais e trabalhos se concretizaram, tornaram-se referência de uma
época, sê-lo-á para sempre. Sério. Penso na eternidade, desejo-a, mas só
alcançarei a partir do instante em que o que faço é referência de conduta,
postura, ideais, sonhos, algo que a humanidade possa se servir para continuar a
sua trajetória.
Ridicularizar, por mais que o visto seja contrário
a estas idéias, ninguém pensa na eternidade, no fruto de seu trabalho tornar-se
útil para os tempos vindouros. As preocupações são bem outras. Referir-me a
elas, seria estúpido de minha parte. Afianço até ser insanidade. Sou apenas um
a ridicularizar. Quem é o ridículo: os outros ou eu? Negar o responsável seria
colocar em dúvida o ridículo, e este existe com todas as letras em estilo
barroco ou “escrachado” como a maioria.
Imagino ora, aliás, creio haver pensado antes, caso
contrário, não há qualquer problema, qualquer movimento imprevisto, de amantes
amando, qualquer toque ou carícia diferentes, que não tenham sido determinado
antes, previstos e analisados as glórias e satisfações; sejam vividos à luz de
toda a luz que vê.
Quem sabe esteja vagando com minha estrela de
profeta! Não sei o que fazer para não negar a imbecilidade. Sei que esta frase,
ironicamente pode ser transformada em notas musicais, mas não sou dotado deste
talento da música, não saberia dizer como. É de deitar no chão de tanto rir.
Vagando com minha estrela de profeta, despontando o
sol de meu jeito e estilo de ser homem, de ser alegre, de ser corpo, de ser
movimento, fala, gesto, voz, sexo, sonho, desejo. E quanto posso realizar,
deixar escrito nalguma estrela do céu, um símbolo que iluminará os homens, a
humanidade, se descobrir que a possibilidade de eternidade para a vida pode ser
realizada, descobrir os dons e talentos escondidos atrás de alguma amurada de
desertos e pedras.
Talvez em razão de minha despossuída maneira de
olhar as coisas, a saber, o brilho de soslaio quando olho alguém, perguntando-lhe
se enfim resolveu comungar as idéias e não os interesses, como é de sua práxis,
não sou ainda visto como alguém quem ironiza até quando fala a sério, não há
quem ou o que possa negar ou duvidar, são valores escritos em todas as luzes
destas estrelas que brilham.
Às vezes, nas escolas, os alunos e professores
conversam, brincam, sobre coisas como o afeto, carícia, tesão, a cidade e sua
Direita de dois lados, quem sabe a palma e a costa. Discutem o ritmo do coração
de cada um, se bate sôfrego ou eufórico. Refletem sobre a vida com sua pujança
de mudar, transformar, derrubar, juntamente com outras vidas a amurada de
desertos e pedras que separam aluno de aluno, professor de professores, pessoas
e cidadãos de pessoas e cidadãos.
Não é esta relação tão sincera, humana, sem dúvida
possuidora de valor universal, eterno, não há o que ou quem possa negligenciar,
duvidar, que faz brilhar a vida. Não sou homem débil quem acredita a noite ser
desnecessária, uma futilidade a mais no meio de inúmeras outras. . A noite é
fundamental. Sem ela não é possível o sonho, o desejo de transpor a amurada de
desertos e pedras, de seguir a trajetória em direção a algum horizonte, seja
ele qualquer, a gosto e paladar de qualquer uma criatura; sem ela não é
possível o encontro e o desencontro das peles; sem ela, ao que se pode criar e
recriar o mundo, mais alegre, mais feliz.
Vésper não apaga a noite, ela nasceu para apagar as
luzes que apagam a noite. Nisto é que está a principal meditação, ridícula,
pois que a nível da superfície é atitude em absoluto descabida. Refiro-me a
estar imaginando que estes pensamentos que me surgem, na alma, no espírito,
seja onde for, não me importa, serem uma Vésper, o objetivo primordial é
despertar para a ausência da inteligência e da sabedoria, estas que ensinam as
luzes que apagam as ignorâncias, burrices, incoerências das criaturas que habitam
o mundo, e nada poeticamente lhes habita.
Com estes pensamentos não haverá mais noite no
mundo. Vésper nasceu para anoitecer o dia que diz que é claro, certo, lógico
que a fome secular e a sede milenar possam existir. Vésper nasceu para tornar
vespertino, manhã, todo mundo, tanto os que passam do lado esquerdo da Direita,
quanto os que o fazem do lado direito da Direita, e mesmo os que apenas a
atravessam.
Não fico com medo pensando que a noite é o lugar e
o espaço em que os dramas, conflitos, traumas, fracassos, sei lá mais o quê, se
soubesse, seria ridículo.
Manoel Ferreira Neto.
(27 de janeiro de 2016)
Comentários
Postar um comentário