**TAÇA AO SOM DE SILÊNCIOS** - Manoel Ferreira
Post-Scriptum: A Peça de Pintura que ornamenta esta obra é a Mais Nova
Peça da Artista-plástica(pintora) e esposa Graça Fontis, 13 de setembro de
2016, realizada exclusivamente para esta obra.
Música do fim, fim de in-auditos murmúrios e silêncios, fim de
inomináveis acordes de instantes-limites e sussurros, inolvidáveis melodias e
ritmos de lamentos e fantasias, quimeras, idílios, a alegria sutil desde o
fundo do dia, o abismo do século, desde o silêncio do nascimento, um silêncio
longo, feito de chuva de perto e ao longe, de neblina cobrindo as serras
distantes, embaciando a vidraça da janela tão próxima, da cidade esquecida em
solidões, do cerco à volta do espaço para além, constelações atrás da lua cujos
brilhos diáfanos resplendem-se livremente, abre-nos de um abandono, um
esquecimento final, num aceno de sinais, numa palavra insensível e fria –
carinho, amor, solidariedade, compaixão... - numa lingua eivada de figuras de
estilo, imagens de conteúdo... - inspiração, percepção, intuição, imaginação
fértil às revelações e anunciações da beleza do belo, da estética-dialéctica da
con-tingência.
Taça ao som de silêncios,
Silêncios das constelações
Atrás da lua cujos brilhos diáfanos
Resplendem-se livremente
Desde o silêncio longo...
Taça ao som de silêncios
- Fim de inolvidáveis melodias e ritmos
De lamentos e fantasias, quimeras, idílios, -
Alegria sutil
Desde o fundo do dia, desde o instante do brinde
Aos rogos do sabor.
Ò míseros compassos e traços de um instante sem fim e início, filhos do
acaso e da preguiça, do crepúsculo e da "lombeira", porque me obrigam
a dizer o que não seria nem um pouco conveniente, se houver conveniência é o
aprender a tocar qualquer instrumento, amar apaixonadamente estes ritmos de
qualidade e belo estilo, dizer o que não seria, em suma, bom ouvirem?
Ó vestígios de notas e filetes de sons de uma música cuja lírica são a
solidão do vento e o silêncio do tempo, concepções do ocaso e do entardecer, da
noite e da leveza, o sono para restituir as energias. O melhor para um
indivíduo, quem sente o ar calmo e temperado, a brisa suave, as sombras
frescas, o aroma da relva, a maresia, o brilho suave do céu sem estrelas e sem
lua, o patear compassado e o resfolegar dos cavalos – todos os encantos da
estrada, da primavera e da noite penetra-lhe na alma, - é não ter nascido, não
ser, ser nada.
Águas correm ruelas, avenidas, estradas, caminhos do campo, em direção
às nostalgias e lembranças de tempos que re-nascem, re-novam em cada movimento de
lábios que buscam palavras a expressarem ao sabor de esperanças os desejos
íntimos de corações selvagens, rebeldes e solitários, estrangeiros e
irreverentes, de mentes humildes e sinceras, de caráter e personalidade
irreverentes, instintos de meigas insolências.
Taça ao som de silêncios
Aprender a tocar qualquer instrumento,
Amar apaixonada e incondicionalmente
As sombras frescas, a maresia, a brisa suave
Dedilhar as cordas sentindo o espírito no
Instante de criação de sua sensibilidade melódica,
A música de "si-mesmo".
Surdos orifícios dividem o que resta de lamber nas têmporas.
Entre(cruzadas) engrenagens entre(devoram) consciências. Conduzidas vozes
pungenciam repugnantes lágrimas. Trevas esturricam o que há de inteligível,
borrificam o que há de perceptível. Víboras entre(cortam) das mentes evangelhos
ilícitos, apocalipses hereges, cântico proscrito. Filamentos escorregam
goteiras simultâneas. Serpentes ladram por elos de prata, sereias evocam cantos
de cristais. Expurgada sedução petrifica faúlhas e jatos de infâmias.
Despedaçado inferno arrulha derrogadas insolentes. Deuses desfolhados erigem
esquecimentos. Glauco chão estupidifica lacunas. Comédia do inferno.
Res-posta. Dada a queima-roupa, simplesmente nonada re-vestida de
palavras, por mais colocadas nos seus devidos lugares, por mais românticas,
nada dizem, nada expressam, destituídas de valores e sentidos. Deixá-las livres
no silêncio é a percuciência da sabedoria, o tempo trans-literaliza-as, re-vela
o instante de serem ditas.
Vida. Sabedoria. Conhecimento.
Res posta do nada auspiciada aos interstícios re-cônditos do efêmero,
nada de futuro, nada de presente, nada de pretérito, palavras que silenciam a
alma, terrenos baldios do inconsciente, vazio pleno, absoluto do
estar-no-mundo, abismo do ser e não-ser suspenso nas linhas trans-versais e
tergi-versadas do horizonte sem luzes, sem trevas, sem brumas, sem sombras,
vagando, per-vagando no espaço celeste que não há.
Taça ao som de silêncios
Re-cônditos do efêmero, cujas luzes pequenas projetam desejos
De mergulho, comunhão com as travessias das contingências
Nada de pretérito, nada de presente, nada de futuro
Linhas trans-versais e tergi-versadas
Do horizonte sem luzes, simplesmente nonada
Re-vestida de palavras
Percuciência da sabedoria, terrenos baldios da inconsciência
Abismo do ser e não-ser.
Todos nos ninguém... Todas as respostas nada. Verdades, in-verdades,
mentiras. E o verbo amar compõe o soneto da resposta do sonho de ser ao verbo
das quimeras e fantasias dos idílios solipsistas das esperanças que nada são
senão a retina da in-verdade pro-jetada, lançada ao léu de confins em plena
vadiagem com as vacuidades do jamais, quando o nunca vislumbra a neblina
notívaga cobrindo o próximo e o longínquo, nada de visão além, nada de enxergar
um palmo após os ventos de leste que seguem as levezas e sublimidades de cursos
res que perfilam idôneos de ilícitos valores e virtudes, amalgamando pérolas e
diamantes do eterno, líricos sentimentos judiciando as harpas ad-verbiais,
cítaras ad-nominais do tempo em que as metafísicas poeiras das virtudes
flanavam espontâneas atrás das estradas infinitivas, demasiadas essências
pretéritas.
Cursos res de uni-versos ad-jacentes aos vazios egrégios habitantes do
efêmero, hilário como expressam em versos ritmados de palavras eloquentes e
ardentes as angústias do eu poético, se se quiser, eu lírico, e ainda postam os
sonetos em epitáfios versáteis e voláteis nas criptas, são a verdade re-colhida
e a-colhida nos interstícios re-cônditos da esquizoidia re-vestida das neuroses
de trans-ferência. Rebanho de lídimos re-presentantes do apocalipse
vislumbrando com os linces dos instintos re-versos da condição humana os
festins do genesis plen-ificados de confetes à luz trans-límpida do crepúsculo
de deuses, fases da lua e estrelas testemunhas trans-cendentes das sincronias
simbólicas e parnasianas da beleza in-versa.
Taça ao som de silêncios
Versos ritmados de palavras eloquentes
Estrofes melodiadas, ardentes
As angústias do eu poético
Festins do genesis plen-ificados
De confetes à luz trans-límpida do crepúsculo
Outrora as metafísicas poeiras das virtudes
Flanavam espontâneas atrás
Das estradas infinitivas,
Demasiadas essências pretéritas.
Res postam vernáculos lúdicos do cogito, extensas emoções pre-figuradas
de mentiras solipsiadas de anticristos absolutos do divino, facticidadas de
antimefistófeles fugazes do demoníaco, assim dizia o nada, em resposta
socrática sarcástica, ao eterno que seduzia o abismo com a poesia do conúbio
dos prazeres fáceis e livres, onde escorregavam saliva e vinho francês no
queixo das contingências absolutizadas e divin-izadas do vácuo cósmico, antes
de quaisquer pre-núncios da vida, quando o mundo criava a náusea ad-jacente, o
ad-erudito aos plasmas da vida, morre a postagem da res no virtual do celeste
iluminado e numinado de a-verdades do des-pleno, des-místico, des-mítico,
des-lendário das estesias expressionistas do além, resposta ao nada que é, ao é
que nada re-presenta.
Tão simples ser as dores do eu, na solidão e silêncio do túmulo, cripta
que seja, a vida re-vela as luzes do vazio. Só a verdade res-ponde ao amor que
diz os sentimentos do puro, a leveza do espírito que voa as águas e asas da
liberdade, as emoções sem sono. Na boate azul das esperanças e sonhos, ouço o
ritmo e melodia da música de quem sou sem ser coisa alguma no tabernáculo do
silêncio.
Taça ao som de silêncios
Testemunhos trans-cendentes
Das sin-estesias da esperança, do sonho:
Ao eterno que seduzia o abismo com
A poesia do conúbio dos prazeres fáceis e livres!
Conheço sobremodo o meu destino. Tenho a impressão de que uma
extraordinária e doce melodia se prepara para visitar-me: já arde e se agita,
já sinto o langor e o deleite de sua aproximação, mas não a aguardo até ao fim,
apesar de trazer em mim todo o tempo do mundo. Um dia meu nome vai se suspender
nalguma parede, apresentando a sua sagrada face, por um profundo choque de
consciência, uma decisão contra tudo o que fora dito, impresso, publicado,
contra tudo que foi acreditado, santificado, divinizado, mitificado. Pensar que
sou aparentado com o pároco poeta do albergue é uma blasfêmia e perjúrio contra
a minha santidade.
Em direção ao infinito, águas re-colhem de nossas vidas o húmus de
recordações simples que preencheram os vazios esplendorosos do olhar
ensimesmado e triste por cima dos acontecimentos inenarráveis, indescritíveis.
Rumo ao eterno, águas acolhem de nossos prazeres a alegria de instantes,
a paz de entregas e mortes, desejando a felicidade que afagamos no íntimo.
Resta olhar o acinzentado do dia de chuva, a certeza, quem sabe, de erguer uma
taça ao som de silêncios e vozes que percorrem o espírito, desejando o paladar
da alegria e realização às lâminas de sonhos e esperanças, o vinho da solidão e
sussurros de sabedoria que perpassam a alma simplesmente um gole de desejo e
volúpia pelo eidos do som.
Não é absoluto preciso, nem mesmo imaginável e desejável, tomar partido
de meus interesses e achaques: ao contrário, uma dose de curiosidade e
bestialidade, como diante de um oponente frágil e taciturno, impotente e
neurastênico, com uma resistência irônica de não assinar ou endossar a nota
promissória que me apresenta, me pareceria um comportamento e postura
incomparavelmente mais sutil e inteligente em relação a mim, egrégia homenagem
a uma postura incomum, merecedora de louros e louvores.
A vida começar aos sessenta é um estado da mente e do espírito. Quisera
cumprir o rol do maestro, os traços do pintor, o ensaio do músico, os verbos do
escritor compostos no silêncio do camarim, enquanto se maqueia, o sentimento de
amor verdadeiro pela amada. Tenho todo o tempo do mundo.
Eis a re-ferência em relação à irreverência que em mim trago dentro,
creio que ainda apenas latente, o que é manifesto não arrepia nem um pouco,
afigura-se mais a uma tapa de luva em todos os dogmas, preceitos, ideologias,
poderia ser mais efusivo, eufórico nas minhas posturas e condutas contra a
hipocrisia.
Atrás da esperança não há senão a esperança. No silêncio absoluto, as
palavras de outrora estremecem de insanidade, o silêncio estala a minha boca
como uma pedra, estala-me os ossos. Toda essa água que anuncia Deus é isso
mesmo – um anúncio, do que jamais foi, na pálida auréola do ar, das casas silenciosas,
da copa das árvores ao longe, raiadas de pingos de chuva, quando o silêncio é
tão profundo que me ouço ser.
Taça ao som de silêncios
Alvorece novo dia, clima de inverno, tempo agradável, Pensamentos e
idéias per-vagam dispersos
Nas nuvens brancas celestiais,
Circun-vagando as constelações,
A alma re-colhe e a-colhe os versos do infinito
Com-pondo de esperanças o sonho
Dos gerúndios do vir-a-ser,
O amor plen-ificando o silvestre das sendas da entrega,
A verdade do verbo ser comungada ao do amor
Re-versejando no espírito o cristalino da pureza.
Mergulhando no há-de ser da felicidade
A con-templar as belezas do inconcebível
Absoluto da verdade-casa-do-ser e eu,
Há um instante em todo esse sentimento em que deve estar todas as coisas
nascendo – há um momento não sei quando.
De novo me assalta a presença obcecante de mim próprio, esta enorme
presença, esta coisa, isto que mora comigo, que é absurdamente vivo, independente,
que desaparece, que retorna, num jogo de reflexos re-versos e ad-versos em que
me vejo, me prescruto, me sinto “eu”... Escuto por trás das palavras o chiste,
o achaque, a ilusão, o espírito galhofeiro da demência dando risadas a plenos
pulmões.
Manoel Ferreira Neto
(Rio de Janeiro,12 de setembro de 2016)
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