#POR ELEITO DA IMAGINAÇÃO, DA CRIATIVIDADE** - GRAÇA FONTIS, ESCULTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
E a "Companheira das Artes", Graça Fontis, deixa os lápis de
pintura, e toma em mão a Goiva para esculpir esta escultura que Ilustra,
Ornamenta este Aforismo.
Um recomeço da Escultura, depois de mais de trinta anos.
Pode ser que não tenha chegado e mesmo não saiba precisamente onde quer
chegar, deixa-se livre no tempo, deixa-se livre no verbo da carne, na carne do
verbo.
Com palavras soltas, o itinerário do verbo "além-de-si",
destituído de espaço, ao espírito do ser, fonte da sensibilidade, do espírito,
fonte do grito presente, gritos antigos são carências de vida, de dons e
talentos para a liberdade da ec-sistência, para o não-ser que a-goniza no tempo
de nada, de vazios, de abismos, de falhas, faltas, manque-d´êtres, forclusions,
que grita aflito, diante da dor, diante das angústias e ipseidades, das
á-gonias e facticidades, sufocando o pranto, mas a luz do grito presente do ser
se re-vela, as miríades do além incidem nas esperanças e sonhos de colher a
flor da vida, e jorra, da sensibilidade e das dimensões sensíveis, os ideais da
ec-sistência que cria a vida, da vida que re-cria as ideias, à luz daquilo de a
arte imitar a vida, a vida imitar a arte, que, perpassados na alma, colhendo,
re-colhendo, a-colhendo desejos, vontades, compõem a escultura do ser, abrindo
as venezianas e persianas da janela do "eu" para o outro além de si,
o outro que é a "casa-da-verdade-do-ser", ser da entrega, ser do
amor, ser dos dons e talentos, ser da contingência que busca o encontro da
beleza, do eterno, através dos sentimentos e emoções, dos questionamentos e buscas,
sobretudo das dores e náuseas da con-tingência.
Não sabe onde quer chegar, estar sempre dis-ponível aos ventos do tempo
e dos abismos que sibilam outros sons, sabe por onde trilhar os passos, porque
na casa da verdade de seu ser, o além de si, em movimentos, decorando-a de
re-flexões, in-vestigações, metáforas, por vezes no frio do in-verno, por vezes
no calor do verão, no perfume das flores na primavera, da serenidade do
crepúsculo do outono, caracteriza o encontro do outro. A decoração da casa é orientada
pelo "ser-aí", no caso específico, o movimento, o leitmotiv que, em
cada instância, é si-próprio. O ponto de partida não é o de mostrar e isolar o
"eu" e depois ir buscar um caminho que a conduza ao além, como querem
alguns que na escultura o eu do artista não é a origem de sua arte, como querem
outros que na poesia ou na prosa o eu do poeta/escritor não está presente nas
estruturas da arte, estética e ética. E quem defende isto de unhas e dentes,
entrega sua vida ao nada, vazio, arrasta-se pelas ruas e avenidas das nonadas e
das pontes partidas, pervaga por terrenos baldios e becos sem saída, e morre, o
tempo esE quem acredita que é perfeitamente artístico esculpir palavras com as
goivas da inspiração passeia pelos vales livre, solto, aberto a todos os
horizontes e panoramas do In-finito.
Senta-se o escultor na amurada de sua residência, de por baixo das
galhas frondosas do ipê amarelo, perscruta a noite, vislumbra as luzes da rua,
antes de iniciar a prosseguir na escultura do "deus pagão", representação
do tempo, dos verbos e do ser da arte desde os gregos até a atualidade, esta
livre de preceitos e dogmas, de estilo e linguagem mesmas, a arte é sempre
re-criação das visões-da-vida, sempre janela aberta a outras visões.
O "eu" grita aflito no peito, o escultor abre os movimentos da
goiva, da poesia em cada entalhe, vislumbra o além de si, a casa da verdade do
ser se a-nuncia, e ela apaga "... os contornos/de amargurar a vida",
trans-cende-se, trans-eleva-se, levando na algibeira da alma o eu, pois
compreende que o "além-de-si" não é só o outro que deseja, mas o
"nós" que é a comunhão do "eu" e do "outro", do
verbo e da carne, a verdade do ser é o nós, o "além-de-si" é o nós, o
coração reagindo à solidão, a sensibilidade con-sentindo o silêncio, o barulho
do silêncio dos sentimentos e emoções, sensações evasivas e dispersivas que
compõem, reagem à id-ent-idade da alma e do quotidiano de todas as
con-tingências. O "além-de-si" é o encontro do nós na casa da verdade
do ser, mas, inconscientemente, vislumbra o silvestre do eterno, con-templa a
imagem do in-finito. A jornada não terá fim, estará sempre em movimento à busca
do espírito divino do ser.
Aquando terminou a sua auto-escultura para receber o certificado da
Escola de Belas Artes, o professor tendo predeterminado iria esculpir no Parque
Municipal, atrás do Palácio das Artes, no domingo, entupigaitado de pessoas, o
professor perguntou-lhe o porquê de se auto-esculpir-se, respondeu-lhe:
"Se ser pequeno é ter a empáfia do orgulho imaginário de grande, prefiro
ser grande com a verdade de estar sempre à procura de quem sou, do meu
em-si." Como lhe dissera uma colega da pintura, beijando-lhe a face, dois
dias antes do exame: "Há-de se não confundir empáfia com hipocrisia, pois
o espírito ambiciona, anseia o crescimento, aspira a verdade do Ser", o
que lhe valeu aplausos de todos os seus colegas, e desse caminho jamais se
afastou.
O escultor e a escultura, na casa-da-verdade-do-ser, comungaram-se, são
o "nós" do "além-do-mundo", do "além-matéria-contingente."
A arte do escultor é, afinal de contas, o refúgio último da liberdade,
que dá forma concreta e material, corpo à imagem, que em toda parte se busca
ser, que oculta o ser. In-augura novo espaço e novo tempo, porque tempo e
espaço lhe são ad-versos.
Na escultura reside por eleito da imaginação fértil, administra-a e até
mesmo tiraniza-a.
(**RIO DE JANEIRO**, 25 DE MAIO DE 2017)
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