#ESCRITORA E POETISA PORTUGUESA Maria Isabel Cunha COMENTA O AFORISMO /**ESMAGANDO PALAVRAS**/#
O autor de uma obra concebeu-a daquele jeito e forma e não de outro
qualquer, porque era o seu jeito. É o seu dom, é o que sente na alma, é a sua
criação. Não importa esmiuçar o motivo, porque escreveu deste modo e não outro,
mas sim apreciar a obra e retirar dela a ilação que cada leitor possa dela
retirar, segundo os seus próprios quesitos e conhecimentos. Cada época marca um
estilo, uma tendência e não é à toa que os estudiosos se debruçam sobre as
obras literárias e todas as obras de arte para estudarem e definirem uma
determinada época. "Esmagar" palavras sem sentido serão pura
paraliteratura. Será que a época atual dá primazia ao simples? Será esta uma
das tendências atuais? O supérfluo não o incluiria no simples, nada será
supérfluo se concebido com alma e saber. Tudo servirá de assunto de estudo para
definição e caracterização da época em que vivemos. Ao autor, ao criador, cabe
apenas dedicar-se à sua arte, se é que a possui, e desenvolvê-la e explorá-la o
melhor que puder ou souber, nada mais lhe poderá ser pedido. Texto muito
pertinente na época em que vivemos, onde o modismo é terminar com todas as
regras aprendidas e inovar, ate mesmo banir a pontuação. A temática é
abrangente, pois a atualidade é rica de imprevistos e inovações incontestáveis,
como o computador que impulsionou o mundo para mudanças nunca experimentadas.
Estamos numa nova era, há que vivê-la e registrá-la cada um com seu dom e
valor. Não adianta guerrearmos, criticarmos ou desdenharmos seja quem for pelos
seus dons ou métodos de dar a conhecer o mundo que o cerca, através do seu
próprio mundo, isto é, das suas vivências, pesquisas e conclusões. Dar
liberdade ao autor ou criador da obra para que ele possa expandir tudo o que
lhe vai na alma. Assim se demarcará a época atual.
Parabéns, escritor Manoel Ferreira Neto, pelo seu excelente texto, bem
como à artista plástica Graça Fontis, pela escultura bem ilustrativa do texto
em causa. Um grande abraço.
Maria Isabel Cunha
#ESMAGANDO PALAVRAS#
GRAÇA FONTIS: ESCULTURA
Manoel Ferreira Neto: Aforismo
Corta-lhe o riso por inteiro. O coração acalentado por uma alegria boa.
Uma promessa de felicidade, criatividade em chamas.
Agora o palco vazio para caber a forma baia e ondulante que progride,
esmagando palavras. Só além das linhas se poderá ter alguma ideia, isto se
considerar uma entrega sem limites à busca de entendimento e compreensão,
conhecimento e saber, o que é absurdo de todo por ninguém estar disposto a
in-vestigar a linguagem e o estilo, avaliar a consciência e o conhecimento de alguém,
dizer o que dentro habita a sua alma, o que necessita tanto de saber para dar
início a alguma sabedoria, esta que mostra, apesar das nuances do tempo e das
situações a que ele está sujeito a todo momento, se assim pode dizer, isto sem
atrapalhar a ideia de que não lhe é dado saber o que realmente está com vontade
de dizer, tornar público, e que, daí por diante, ninguém mais se veja olhando,
observando as suas atitudes, ações, o que nelas discorda das palavras ditas,
escritas, pensadas e imaginadas, seguindo as invenções e criatividades que o
dom lhe dera a possibilidade de buscar realização ou um fracasso em limites e
fronteiras: brinca com as palavras, é precisamente isto que mais realiza quando
se entrega a esculpir de modo inteiramente inusitado, não havendo qualquer
respecto às leis da escrita, aos limites da criação, e daí nada mais pode dizer
que justifique, que lhe indique, embora só ele mesmo sabendo, nada dizendo,
nada registrando, buscando palavras que desmanchem o que de algum modo pode ser
intuído e percebido, cabendo à inteligência estabelecer a sabedoria existente
nestas palavras entre os afagos de querubins.
Havia esculpido a imagem de Nietzsche, uma espécie de homenagem ao
filósofo. Numa exposição de suas esculturas no Palácio das Artes, Belo
Horizonte, Minas Gerais, alguém lhe perguntara: "O que Nietzsche está
pensando?" Respondeu: "Pergunte a ele. Não se ressinta por ele não
ter voz e palavras para satisfazer a sua curiosidade." Lembrou-se de sua
saudosa amiga pintora Martha Moura dizer-lhe o que mais odiava era alguém
perguntar o que ela queria dizer com a pintura exposta, sempre respondendo ela
nada diz, quem diz é a pessoa; e também de um escritor: alguém lhe perguntara o
porquê de escrever na ortografia antiga, respondendo ele à pessoa: "Porque
sou mais velho que a cidade de Braga." Engraçado isto: os artistas sempre
tem respostas hilárias para as perguntas e considerações, despautérios do
público.
Um lugar de agradáveis discussões, a discussão do talento e do dom num
mundo em que se dá primazia ao simples, ao supérfluo, ao que responde pelos
interesses da ideologia e do modismo.
(**RIO DE JANEIRO**, 26 DE MAIO DE 2017)
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