#ESMAGANDO PALAVRAS# - GRAÇA FONTIS: ESCULTURA/Manoel Ferreira Neto: Aforismo
Corta-lhe o riso por inteiro. O coração acalentado por uma alegria boa.
Uma promessa de felicidade, criatividade em chamas.
Agora o palco vazio para caber a forma baia e ondulante que progride,
esmagando palavras. Só além das linhas se poderá ter alguma ideia, isto se
considerar uma entrega sem limites à busca de entendimento e compreensão,
conhecimento e saber, o que é absurdo de todo por ninguém estar disposto a in-vestigar
a linguagem e o estilo, avaliar a consciência e o conhecimento de alguém, dizer
o que dentro habita a sua alma, o que necessita tanto de saber para dar início
a alguma sabedoria, esta que mostra, apesar das nuances do tempo e das
situações a que ele está sujeito a todo momento, se assim pode dizer, isto sem
atrapalhar a ideia de que não lhe é dado saber o que realmente está com vontade
de dizer, tornar público, e que, daí por diante, ninguém mais se veja olhando,
observando as suas atitudes, ações, o que nelas discorda das palavras ditas,
escritas, pensadas e imaginadas, seguindo as invenções e criatividades que o
dom lhe dera a possibilidade de buscar realização ou um fracasso em limites e
fronteiras: brinca com as palavras, é precisamente isto que mais realiza quando
se entrega a esculpir de modo inteiramente inusitado, não havendo qualquer
respecto às leis da escrita, aos limites da criação, e daí nada mais pode dizer
que justifique, que lhe indique, embora só ele mesmo sabendo, nada dizendo,
nada registrando, buscando palavras que desmanchem o que de algum modo pode ser
intuído e percebido, cabendo à inteligência estabelecer a sabedoria existente
nestas palavras entre os afagos de querubins.
Havia esculpido a imagem de Nietzsche, uma espécie de homenagem ao
filósofo. Numa exposição de suas esculturas no Palácio das Artes, Belo
Horizonte, Minas Gerais, alguém lhe perguntara: "O que Nietzsche está
pensando?" Respondeu: "Pergunte a ele. Não se ressinta por ele não
ter voz e palavras para satisfazer a sua curiosidade." Lembrou-se de sua
saudosa amiga pintora Martha Moura dizer-lhe o que mais odiava era alguém
perguntar o que ela queria dizer com a pintura exposta, sempre respondendo ela
nada diz, quem diz é a pessoa; e também de um escritor: alguém lhe perguntara o
porquê de escrever na ortografia antiga, respondendo ele à pessoa: "Porque
sou mais velho que a cidade de Braga." Engraçado isto: os artistas sempre
tem respostas hilárias para as perguntas e considerações, despautérios do
público.
Um lugar de agradáveis discussões, a discussão do talento e do dom num
mundo em que se dá primazia ao simples, ao supérfluo, ao que responde pelos
interesses da ideologia e do modismo.
(**RIO DE JANEIRO**, 26 DE MAIO DE 2017)
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