#ROSAS GUARNECIDAS DE OURO E RISO NAS PALAVRAS, NAS COISAS, DE LIBERDADE E SARCASMO#* - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
A pura falsidade é uma marionete que se acaricia, alenta todos os dias,
sim, e ninguém pode negar esta sua dimensão, pois que assim perde a poesia de
seguir uma alameda tranquila e serena com suas atitudes, gestos, etc, e tal.
Espírito de sacrifício? Alma de mártir? Por onde passei, o caminho é
ruim. Devasto e torno in-transitável todo o caminho em que piso. Saí não à
francesa, sim de cabeça erguida, do tropel dos compassivos - a fim de entender
e compreender o porquê de a compaixão ser molesta, só quem está de fora pode observar
as falcatruas das coisas. Abnegação levada ao extremo, ao paroxismo: ou
ingenuidade incurável daquele cuja escolha se fixa nas atitudes que julga as
mais simples, ações que ajuíza as mais inteligentes e conscientes, ou inocência
irreversível daquele que se equilibra no fim da linha entre a sabedoria e o
absurdo do conhecimento – se não há convivência com alguém, não é mais simples
ficar em silêncio com a pessoa, mantendo a distância conveniente e inteligível,
respeitando os seus direitos e deveres, re-levando a Grande Muralha da China
chamada contra-senso entre a justiça e os deveres, corrupção e respeito?; não
consigo imaginar outra.
Inteligível e conveniente "não é ruminar ouro e riso”, mas o
ruminante sejam o desejo e a vontade do ouro e do riso, a utopia e a vontade do
prazer e da alegria, ícone do belo puro. Esta simplicidade apareça aos olhos de
todos como o intrépido, como o paradoxo, de uma posição e decisão na vida, como
a irreverência e rebeldia, de conduta e postura na liberdade de inventar a alma
da morte, de investigar os baldios no vazio das terrenas á-gonias e angústias,
no poder de cristalizar princípios, apotegmas, máximas.
Sinto-me sorrir com os cantos da boca, os olhos faiscando. Percebo ou
intuo algum sarcasmo, ironia? Coisas apenas circunspectas, intros-pectivas. A
única coisa que o relógio simboliza ou significa, enchendo, com a sua presença,
as horas, é a curiosa e insípida sensação de encher o dia e a noite com a
presença das horas, com o vai-e-vem do pendulum dos segundos, com as silvâncias
do vento nos abismos.
Todo o alpendre estala de uma presença intensa, alguém mais ali,
flagrante sinto-o, não vejo ninguém. Uma vaga passa, invisível e grande, ao
balancear dos meus olhos pelo horizonte, sinto-me bem, experimento uma canção
que me aparece nos ouvidos. De qualquer modo que sinta o verão – desagradável,
porque é quente; enfastiado, por ser cansativo, lombeira por ser entediante -
assim, porque assim o sinto, é que é meu dever senti-lo, obrigação
experienciá-lo, vivê-lo, compromisso pro-jectá-lo alhures, quiçá re-vele
dimensões olvidadas da in-consciência.
Volto a re-conhecer na casualidade um destino e nas ruínas de minha vida
fragmentos espirituais, na ocasidade uma missão de irreverenciar as condutas e
posturas de má-fé à luz do passado que no seu crepúsculo ainda irradia doce
resplendor, exala perfume fresco e silvestre que inebria de utopias e sorrelfas
das criações.
Em que contribuem as semânticas, línguísticas, estilísticas? De que
adiantam então as palavras, os sentidos, os significados? De nada adiantam. Com
certeza. Servem para brincar - bem, para mim, é para brincar, passar o tempo
até daqui a pouco, enrolar as nuvens brancas no papel de seda laminado, quando
já imaginar que não sobrou mais nada a garatujar, registrar, quando houver
adquirido a sabedoria de que as últimas possibilidades agora são do tempo e da
eternidade, os derradeiros prováveis agora são do verbo e do ser.
As imagens sucedem-se a um ritmo extraordinário, mágico, rigor
voluntário no sentido de ir unindo-as, critério livre no sentido de
alumbrá-las, elencá-las, sem deixar perder uma característica muito singular, a
sua singeleza na sedução e na conquista, singeleza de perspicácias,
inteligência e sensibilidade, simplicidade de formas não destoa de harmonias
discretas e requintadas, arrebiques sin-tônicos e simpl-ificados.
O que mais assusta nisto de contemplar todas as situações e
circunstâncias da vida, recriá-las, tornando-as atitude e generosidade.
Contudo, dizer somente de “doces” e “chocolates” não fazem o estilo de alguém
que busca e trabalha sua realidade no sentido de atingir a Vida, e não somente
o sentido dela.
Ruminando ouro e riso, construo com as mãos, são elas o objeto do
intelecto, a vida que desejo viver, o ser que sonho nele ec-sistir. Dir-se-ia
que agora há em tudo ouro velho, bronze, cobre, e isto com o azul acinzentado,
excessivamente harmonioso, com tons de reflexos.
Para mim, águias deverão trazer alimento em seus bicos; o torresmo de
toucinho fresco alimento para a fome insaciável; o canto da coruja ser a pedra
de toque da vontade de conhecimento.
É preciso desejar ser autêntico numa luta e que a maioria demonstra uma
indiferença total; quando nos atrevemos a isso, é preciso sentir a força de
sermos alguma coisa em nosso tempo, é preciso ser ativo, para ousarmos dizer se
não aguentarmos: vou para onde outros foram, os que ousaram. Acerca da
possibilidade de recuperar a unidade do mundo, o nexo existente entre todos os
acontecimentos, entre o mundo e a terra, entre a con-tingência e a
trans-cendência – ora esta ínfima lacuna basta para explicar a redenção do
sofrimento a pessoas ávidas de saber.
(**RIO DE JANEIRO**, 04 DE MAIO DE 2017)
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