**RE-VERSO VAZIO DA SOLIDÃO** GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA
EPÍGRAFE
Para quem
sabe realmente ler, eis a História do Brasil!(Manoel Ferreira Neto)
Roubaram de
mim o echo de vozes que ouvia em silêncio, sentindo em mim dentro os sons do
sublime. Roubaram de mim o absoluto que me legava as dimensões da verdade, em
cujos eidos re-colhia e a-colhia a visão nítida e trans-parente do vir-a-ser de
conquistas, realizações e glórias. Roubaram de mim o eterno nos interstícios de
que vislumbrava, con-templava a perfeição solene da vida, vida de felicidades e
alegrias incólumes. Roubaram de mim o éden de prazeres, êxtases, onde
refestelava-me à sombra de árvore frondosa, as águas cristalinas passando leves
e serenas, con-templando maravilhoso panorama, a beleza em sua pureza e
simplicidade.
Roubaram de
mim o verso que embelezava as letras com os sons silenciosos do espírito, com o
sibilo solitário da alma, de cuja inspiração retirava o eidos das metáforas dos
desejos e vontades, das esperanças e sonhos. Roubaram de mim a metafísica do
ser, em cujo cerne dava asas à plen-itude da etern-idade, do perpétuo,
deixando-me a leveza do ser.
Roubaram de
mim a palavra que seria a chave de todos os cofres secretos, e no lugar dela
fora sentenciado a criar inúmeras, milhares para tripudiar este roubo que me
custa o olho da cara, com elas abro outros cofres, mas o que precisava ser
aberto não o será, só a palavra roubada abriria, abrirá. Mas esta ausência
fizera com que criasse a algazarra de palavras, o silêncio que as habita é
imenso, inestimável, e não é que nele estão os segredos secretos.
Vazio, tive
de criar o verbo para eivar o desejo de buscas, mas arranquei de dentro o
efêmero de todas as coisas, seus modos e tempos acontecem num átimo de segundo,
e nasce o nada em cujo "érito" se localiza, habita o vir-a-ser do
outro, se o outro se faz na continuidade dos efêmeros e nada, os efêmeros e
nada se fazem na continuidade dialética do tempo e do verbo.
Roubaram de
mim a linguagem séria e digna, sem metáforas, metafísicas, de quem sou,
segredos íntimos guardados nos cofres inconscientes, e assim tive de
in-vestigar a critério e rigor o estilo com que delinear as idéias e
pensamentos, conjugar com destreza e perspicácia os verbos, regenciá-los com
excelência, e com ele hoje degusto aquele prazer e satisfação de quem prossegue
desenhando a liberdade que constrói as alamedas do ser.
Angústias,
tristezas, naúseas, melancolias, nostalgias, saudades, passo a passo encontros
e des-encontros, passo a passo medo e coragem, passo a passo inspiração e
sentimento frígido, emoção impotente, passo a passo o amor e a ausência do
espírito supremo da vida, passo a passo a con-tingência e a morte, passo a
passo o tempo e o vento, passo a passo a dialética do efêmero e do nada.
Roubaram de
mim... Leguei-me, doei-me a duras penas o re-verso vazio da solidão que
peregrina no deserto rumo à montanha de orquídeas e cáctus, sabendo de antemão
às revezes que se a-nuncia e envela-se a cada vintém de léguas, mas a esperança
do encontro cria a verdade do ser, o sonho do ser cria o verbo da conquista e
glória, a fé cria o divino. Con-verti-me a fáceis tintas ao arranjo e melodia
do nada que a-nuncia outras jornadas pelas veredas do ser, viagem sem fim, mas
os portos são os nossos descansos e reflexões, observando as ondas do mar.
Em verdade,
em verdade, a vida são itinerários por alamedas, becos, estradas, caminhos da
roça, terrenos baldios em direção ao nada que coloca nas mãos feitas concha a
bússola de outras trilhas junto com a ampulheta em cujo interior passam os
grãos de areia revelando a fin-itude do estar-no-mundo, do ser-com as coisas,
objetos e homens.
Tem dias que
a gente se sente como quem encontrou o tesouro na caverna, o pote de ouro no
fim do arco-íris, a eternidade no nada, e a gente pensa haver tornado nítida e
trans-parente a luz no caminho de trevas, mas em verdade a gente eiva de
cor-agem os verbos da esperança, de colocar a liberdade em questão, seguir a
floresta de sendas e veredas do mistério e iluminação, a estrada de poeiras e
in-verdades do pó, por vezes orando nos templos de sonhos(consciência e
sabedoria.)
(#RIODEJANEIRO#,
05 DE OUTUBRO DE 2018)
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