ALDEIA DE LÁGRIMA DOS INSANOS - III TOMO #UTOPIA DO ASNO NO SERTÃO MINEIRO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: ROMANCE
CAPÍTULO XII
- PARTE III
Em verdade,
dizia respeito a outra situação com mulher. Não soubera o pai, nada dissera
sobre o fato de alguns meses antes haver se relacionado com a filha de Murilo
Bustamontes, o inimigo congênito do pai. Molina Bustamontes fizera faculdade de
Estudos Sociais. Encontravam-se e conversavam muito. Começaram a namorar.
Tiveram relações íntimas. Engravidou-se.
Soubera ele
que Molina havia tido eclampsia, a filha de cinco meses de gestação chegara a
nascer, está no balão de oxigênio, a mãe passa muito mal. Não havia dito a
ninguém, fazia seis meses que não aparecia em Lágrima dos Insanos. Soube disso
quando fora ao fórum para audiência com o promotor. Primo de Molina
dissera-lhe. Não está passando bem, corre perigo de morte.
Começara a
beber muito. Medo de as famílias saberem ser ele o pai; Ratto Neves vai ficar
uma fera com ele. É capaz de o expulsar de casa. Tirar-lhe o direito da
herança. Poderá fazer de tudo. Quanto a isto, não é problema tão sério a ser
preocupado. Mas a família de Molina. Com certeza, poderá aparecer morto em
qualquer lugar do campo.
Acontecera
algo semelhante com Ratto Neves. Conhecera mocinha no restaurante no centro de
Lágrima dos Insanos. Começaram a conversar. Levou-a em casa, sentindo-se o mais
feliz dos adolescentes. Naquela noite mesma, começaram a namorar. Estava feliz.
Algumas semanas depois, Célia Monteverde, sua amiga, chamou-lhe, contando-lhe
que Sônia Castrado estava saindo com outro rapaz. Eram vistos numa lagoa perto
da fazenda deles. Estava claro que estavam transando. Não quis acreditar.
Prometeu a si mesmo investigar a história. Nada descobrira. Verdade é que as
pessoas olhavam-no, quando passava. Certamente, lembrando-lhe de que estava
sendo traído pela namorada. Estava namorando com rameira. Ficara dias sem sair
de casa de tanta vergonha. Namorou com prostituta. Terminou com a namorada,
dizendo-lhe que não a merecia, não era mocinha para o seu bico de filho de
limpadora de buxo. Molina acreditara, pois a família já estava falando que não
se devia namorar com gente desclassificada. Não sabendo os pais que Sônia Castrado
era a desclassificada. Era pobre, miserável, mas não desclassificado.
- Aquela ali
é uma rameira sem brio e calafrio... Isto passa. Paixão acaba logo. Mas como
estava lhe dizendo, Ragozina... O que significa ter tanto gado no pasto, alguma
economia no banco, se a vida continua a mesma, carrego traumas, fracassos,
frustrações, neuroses tantas que não sei quantas, no fritar dos ovos a morte
fria e solene. Nada tem sentido algum.
- Vamos
dormir, amorzinho... Amanhã vai se sentir melhor.
- A história
das chaves... Depois delas é que fiquei mais deprimido. Deu-me na teia que eram
a solução de minha vida, abririam as portas que me conduziriam a vida digna de
ser humano. Acompanhando você até à igreja, pensava nas chaves. Que portas
iriam abrir? O que a abertura das portas iria proporcionar-me? O que há para
ser modificado e mudado na vida? Coisas assim pensava eu... Não encontrei
qualquer resposta. Encontrei, sim. É o cheiro de merda que trago nas entranhas
e no corpo. Tenho de modificar é isto na minha vida. A propósito, será que há
algum detergente próprio para estes casos?
Levantou-se
da rede. Encostou-se ao parapeito da grade da varanda, os cotovelos sobre,
amparando o queixo. Olhava a escuridão. Sinceramente, desejava que eu estivesse
nalgum lugar do pasto, não longe da casa. Porque assim desejara é que não sei
explicar. Ragozina continuava sentada olhando-o de costas.
Manoel
Ferreira Neto
(OUTUBRO DE
2005)
#RIODEJANEIRO#,
11 DE OUTUBRO DE 2018)
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