TRANSEUNTES ANÔNIMOS# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto & Graça Fontis: PROSA POÉTICA
Por
instantes desejei ser um
Desses
transeuntes anônimos
E
misturar-me ao povo,
À poeira do
asfalto ou
Ao
burburinho das lojas;
Fugir para
sempre deste mausoléu
Trépido e
frio
E mergulhar
neste mundo intenso,
Enigmático,
um colorido fantástico
Camuflando
segredos invioláveis
Subjetivados
em rostos e sorrisos
Atitudes
relevantes e previsíveis
Desconhecidos
casuais... sensuais
Por instantes...
imortais.
Ânsia do
existir: sentimento do vazio. Complexidade. Ausência de sentido da vida.
Entrega à leveza no existir. Fechar os olhos, esvaziar a mente de idéias, a
língua de palavras, enquanto observo através deste mausoléu os transeuntes anônimos.
Só me resta um fio de desejo, esquecendo-me da vigília de olhares de esguelha,
soslaio, de banda para os solstícios do "Ser" que paraclitam o
pássaro a re-duplicar o canto para a sinfonia e ópera da fé na esperança do
sonho. O desejo de escabichar esta ausência.
É importante
estar acordado para ver o que tem de ser visto, a poeira do asfalto, as folhas
secas espalhadas na calçada, a menina, transeunte anônima, carregando a
pastinha, indo receber as lições do professor, o boêmio cogitando ser importante
dormir para sonhar com a falta de tempo, o advogado, de terno e gravata,
confere as horas no relógio de pulso, o som é macio, sem a menor estridência,
marcha como um cavalo de crinas longas, solto e sem sela.
Sentindo
profundo o demasiadamente humano, a imperfeição para auscultar o inaudito dos
mistérios e enigmas, ouvir os interditos minutos entre o pulsar de meu coração,
os sentimentos que lhe perpassam, sentimento de sentar-me no banco da pracinha,
ouvir músicas, ser mais um entre todos que deixam o tempo deslizar tranquilo,
passeando, conversando com os amigos, comendo pipoca, a mãe que, segurando as
mãozinhas da criança, ensina-lhe a caminhar. Nada menos estou senão agarrada a
este mausoléu, esperando o sono tomar-me por inteiro, viver, coisa que não
conheço, sei lá se viver existe, se existiu antes - antes de quê? quando?
Bem tarde os
corpos cansados encontram-se em sono profundo,
Ouve-se o
estrepitoso e ensurdecedor som anunciando a tempestade, raios fosforescentes
riscam, invadem o céu dentre a escuridão. Madrugada tensa, assustadora.
Acordam... Sei lá se existir vive, se viveu antes. Olho os corpos que
perambulam na rua, corpos cujo fundo não se vê e que são a escuridão das trevas
malignas de seus instintos vivos como ratos, lagartos, camuflando segredos
invioláveis, encapuzando medos indescritíveis. Mergulhar neste mundo intenso,
fugir para sempre deste mausoléu trépido e frio. Transeunte anônimo.
#RIODEJANEIRO#,
09 DE NOVEMBRO DE 2018
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