#AFORISMO 507/INSPIRAÇÃO DA ÚLTIMA PROSA DO ANO# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Tudo último num dia apenas - quê esplendor! Tudo a afluir-a-ser num
átimo de segundo, tudo a re-nascer.
Últimas palavras, seja poesia, seja prosa, seja de carinho, seja de
amor, seja de solidariedade, seja de compaixão, seja alcoviteira, seja de baixo
calão, nada seja, não esqueçamos o nonsense. Últimos abraços, sejam
diplomáticos, sejam fervorosos, sejam quebra-costelas bem cinchaditos no más,
sejam de tamanduá, sejam de promessas de uma união perfeita entre namorados,
noivos, ficantes, casados, causos íntimos.
Último banho, sais especiais, sabonete cheiroso, até a alma fica
limpinha. Perfume especial. Última barba, bem escanhoada, loção primorosa, bem
cheirosinha. Último amor bem aconchegante, estrelinhas depois do clímax, mais e
mais promessas de um futuro de mais gozos, êxtases.
Último soneto, a chave-de-ouro revelando outros sonhos, outras esperanças,
outras utopias, outros desejos, rimados e ritmados com o vir-a-ser de outro
amanhecer. Última prosa, recitando, declamando os verbos do in-finito, as
conjugações do tempo.
Ainda não escrevi a última prosa deste último dia do ano. Deveria
fazê-lo, ficar como re-cord-ação, lembrança de um tempo, da vida que se
trans-correu nos trezentos e sessenta e cinco dias, se mergulhando no
inter-dito de tudo que fora escrito, encontram-se sentimentos dentro de
sentimentos, uma bela in-vestigação do que passou, in-ventário primoroso,
tornou-se memória. Só mesmo mais tarde, se se me anunciar alguma inspiração
última - quem sabe sobre a inspiração última, seria bem interessante.
Estas primeiras palavras da última prosa que virá são apenas sementes.
Mas, então, como fica: o último é sempre o primeiro; a última inspiração, a
primeira, e ela nunca se esgota. Não há a última inspiração. Algumas coisas
deste último dia são últimas, ficarão no pretérito, só lembranças.
(**RIO DE JANEIRO**, 31 DE DEZEMBRO DE 2017)
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