Manoel Ferreira Neto ESCRITOR E POETA ANALISA O POEMA /**REALIDADE**/ DO POETA Paulo Ursine Krettli PINTURA: Graça Fontis CRÍTICA LITERÁRIA: Manoel Ferreira Neto
O poeta Paulo Ursine Krettli, em seu poema /**REALIDADE**/, revela o
"eidos" de sua obra, de seus dons e talentos, a Criação, como ela
nasce, como se torna Realidade, a "realidade" poética do poeta.
Eis o excerto que isto comprova e fundamenta: "As palavras por si
próprias não são poesia;/moro na elasticidade e confronto delas,/
faço guerra dentro do silêncio." O silêncio é a pedra de toque para
a a-nunciação das Artes em suas di-versas e ad-versas dimensões, é a luz da
estética, da consciência-estética-ética, das mensagens, sejam con-tingenciais,
espírituais, sejam filosóficas, metafísicas, teológicas, em cujos inter-ditos
linguísticos, semânticos, os leitores re-colhem e a-colhem
"sementinhas" para suas reflexões, meditações, traçando outras
perspectivas, horizontes e uni-versos para suas buscas, sejam do Amor, da
Liberdade, da Paz.
Diz o poeta de sua "guerra dentro do silêncio"... No silêncio,
constituído e instituído no inter-dito do poema, da obra literária, habitam
todas as dimensões con-tingenciais e trans-cendentais. A sua guerra é o
mergulho na sensibilidade, a pres-ent-ificação da espiritualidade, a
a-pres-ent-ação dos abismos do ser, e isso requer, reivindica a sapiência da
habilidade das palavras, elasticizá-las, multi-plicar-lhes os sentidos, estilo
e linguagem concebendo a metafísica poemática, metáforas e sin-estesias gerando
o tempo linguístico, respeitando e enfatizando o uni-verso da pureza, da
simplicidade... O uni-verso ursiniano é a simplicidade, a busca incólume da
pureza da alma humana, desde as origens, uma viagem genealógica do homem.
Há-de se ressaltar nesta guerra da criação poética, almejando o alcance
da pureza da alma, onde residem os sonhos, esperanças que serão frutos da
realização da "Humanidade do Ser", o poeta sente a necessidade de
"dar corte" nas linhas poéticas, corta a linearidade das idéias,
pensamentos, corta a horizontalidade das intenções e desejos, o que, por vezes,
deixa os leitores suspensos em suas interpretações e análises. /**REALIDADE**/
é a dimensão metapoética, o seu interdito. O poema poderia resvalar-se em pura
abstração, e por isso ao longo da obra Paulo Ursine faz os seus cortes, e
termina com **Há uma fábula e um chão que se multiplicam." Fábula e chão
são terrenos em que a poesia se elasticiza, adquire o solo literário e poético.
Manoel Ferreira Neto
REALIDADE
POEMA: Paulo Ursine Krettli
O metapoema ruiu-se no meio da abstração.
Poesia, desde a criação à morte!
Nada de inanimar a poesia,
fazer dela o estático e o esquecido.
Meu corpo tem movimento,
navego sem indiferença: o sol e a lua,
a dor e o gozo comprazem-se em mim.
Tenho motivos para cantar a minha cidade
e os segredos de cada viagem.
Casas, muros, simples flores do tempo.
Se a chuva cai à noite,
a natureza menstrua-se femininamente,
a sementinha vem sem equívocos
e o fruto guarda outras sementinhas.
Poesia, significantemente poesia!
Eu minto e invoco, aborreço-me.
Imagens perdidas por entre as portas
e vago psiu...
Não quero perder a sensação da infância
(a varanda fazendo curvas com o rio);
insisto na conquista da fantasia
(meu carrinho de carretel vencendo outro obstáculo).
As palavras por si próprias não são poesia;
moro na elasticidade e confronto delas,
faço guerra dentro do silêncio.
A mulher carrega, maternalmente,
o seu filho em sua bonita barriga.
A poesia corre,
brinca,
pula
e chora,
contempla o sonho que não é definitivo.
Há uma fábula e um chão que se multiplicam.
(**RIO DE JANEIRO**, 28 DE FEVEREIRO DE 2017)
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