#AFORISMO 1000/ A ILHA# - PROJECTO #OS 22 QUE ANTECEDEM O MILÉSIMO# - GRAÇA FONTIS: POEMA E PINTURA/Manoel Ferreira Neto: PROSA INTERTEXTUALIZADA



Ocaso, se visto, con-templado, enxergado sob outros prismas e perspectivas, aquele olhar denso, em cujos fictícios cais da memória reside o lince que re-colhe e a-colhe neve prata sobre as ondas, revelará sobre a língua do tempo o que vibra em segredo, isto o que se me a-nunciou num átimo de instante, com evidência deixando-me surpreso e admirado, tanto que me perpassara um calafrio na espinha dorsal tendo lhe sentido profundo, e esvaeceu-se.


Não tenho certeza, se alguma vez já experimentei um sentimento tão presente e forte, mas o que vibrava em segredo - sei o que desejo dizer, mister encontrar as palavras certas - podia ser investigado em todos os níveis, sobretudo o inconsciente, solstício de inverno a vista da vidraça da janela, cheiro, paz, espalhando sentidos ininteligíveis, podendo isto explicar no instante do mover de párpados, não havendo quem não confesse serem as palavras certas, nos seus ínfimos átimos de instante, não tenho polícia na minha captura, a minha ilha não tem porto, o padrão de mitos por que vivera muito tempo... desmoronaram de repente.


Posso dar voltas no jardim pelos seus caminhos sinuosos por alguns minutos, desejando traçar as idéias e pensamentos, sentimentos, emoções, o ziguezague, o mar trans-lúcido a tocar-me, perdendo-me, distanciando-me, dispersando-me, estando inda lúcido, estando inda racional, confissão completa, desabafo rasgado de verbos, diria muito pouco daquele instante de calafrio na espinha dorsal, pensando que poderia enviar para Freud e a alguns de seus colegas dogmáticos sobre isto de não me ser dado dizer o sentimento que me perpassara o íntimo, mas algo dizia-me "... a noite esconde ilhas a quem não sabe pescar...", a resposta a este dizer levarem-me longos anos e inda pouco seria para sentir e contemplar o que é pescar numa ilha em que a noite não esconde, remessando-me para o vazio, solidão, murmúrios nesta tépida noite, e a mesma voz dissera-me em Latim "Nemo me lacessit impune", imaginando eu que assim seja escrito, mas habitando os mistérios do calafrio na espinha dorsal, tendo compreendido seria um prisma de re-velação deste sentimento neste/nesse ocaso que o senti, aportando-me, dando-me ao cântico das águas. Embora não soubesse o que a máxima latina significa, para mim significava, se assim posso asseverar com lucidez, um suporte psíquico para o entendimento de "... a noite esconde ilhas a quem não sabe pescar...", assim descobriria o acaso de passar alguns dias numa ilha, hospedado em casa de uns amigos, indo ao topo de um morro para assistir ao ocaso, tendo a vista do mar à frente, de longe, ilha pequena, esquecida, onde ninguém sabe de ninguém, tocada pelos ventos do norte. Em quaisquer outros pores-do-sol não me seria re-velado este sentimento. Inconscientemente estou espalhando pistas de minha identidade, como diz Hamlet, os sonhos podem se converter em qualquer coisa, o investigar com percuciência, platinando exibições no crepúsculo, revelar-me-á a dádiva, a graça de estar realizando esperanças antigas, o pôr-do-sol à luz de sentimentos reais e verdadeiros, lânguidos e precisos passos ao se diluírem na areia inocente, nós dos nossos sais, em quaisquer sóis das quatro estações, em êxtase. A língua do tempo interpreta no chão desta caminhada há cores, brilhos estelares, tudo vibra em segredo.


O casal de amigos e eu ficamos conversando até altas madrugadas sobre suas experiências, o que sentem no crepúsculo, na orla do mar, instantes mágicos e "claro, de mãos entrelaçadas, curtindo nossas "cositas" ideais e íntimas...", disseram-me rindo, e a pintora gentilmente, sorrindo, dissera: "Deixe comigo, enviar-lhe-ei um quadro de um porto... Alguém observando-lhe de longe num crepúsculo", era o seu modo de dizer que representaria na tela o que sentira eu naquele ocaso do alto de um morro, o mar visto ao longe. Despedindo-nos, dissera-me o escritor: "Não se esqueça do que ouvira, a voz que lhe dizia sobre a noite esconde ilhas a quem não sabe pescar... Nemo me impune lacessit... Certeza de que desvendará mistérios inestimáveis de sua existência...


(#RIO DE JANEIRO#, 01 DE AGOSTO DE 2018#)


#A ILHA#
GRAÇA FONTIS: POEMA E PINTURA


Ilha pequena, esquecida
Onde ninguém sabe de ti
Tudo vibra em segredo
Cheiro, paz, vida
Rompem seus domínios inacessíveis
Há nos céus um solstício
de inverno florindo
No chão há cores, brilhos estrelares
Tocadas por ventos do norte
Neve-prata sobre as ondas
Platinando exibições no crepúsculo
Só, solidão, murmúrios
Marítimos surdos
Acolhidos na tépida noite insinuada
Que circunda um rastejar
Lânguido e preciso
Ao se diluir na areia inocente
Trêmulas de virgem feminez
Um volver e revertem-se a conjugarem
Porto, vento e tempestade
Minha ilha não tem porto
Somente, ele, meu mar
Fantástico, translúcido a tocar-me
Sedento e claro como cristal rebelado
Da minha carne, corpo
Eu do teu sal
Em quaisquer sóis
Sóis das quatro estações
Incontida em comunhão
Onde a noite esconde ilhas
A quem não sabe pescar
E
No fictício cais da memória
Não aportou
Nem deu-se ao cântico das águas
Em êxtase
Onde a idade não pese
Mais que pétalas
Sobre a língua do tempo
Aqui e agora, hora
Interpretando solidão.


(#RIODEJANEIRO#, 01 DE AGOSTO DE 2018)


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