**JÁ QUE PERDEU AS RÉDEAS DA MULA** - PINTURA: Graça Fontis/SÁTIRA: Manoel Ferreira Neto
Dose de poesia para espairecer as idéias, comungada a algo semelhante a
piada. Enfim, não é fácil rir a todo instante, havendo a vontade de parar,
olhar o mundo de modo sério, compenetrado, mas isto é impossível fazê-lo já que
perdeu as rédeas da mula. Um riso poético dá outra tonalidade à vida, ao mundo,
tudo se assemelha às histórias que o monsenhor está cansado de contar em
sermões tão empolados.
Contara Ragozina Neves que Padre Leopoldo Nogueira, após a missa das
sete, achara conveniente explicar o que ouvira dizer sobre ele e Monsenhor
Ludovico Pereira. Estavam dizendo por toda a cidade que havia ele, Padre
Leopoldo Nogueira, sonhado que estava ouvindo noticiário diretamente do céu, e
que o apresentador era o próprio Deus. Monsenhor Ludovico de imediato quis
saber como sabia que era Deus, respondendo-lhe que no fim do noticiário ele
disse: “Boa noite e até amanhã, se eu quiser”.
- Este comentário é mesmo da imaginação fértil de nossa comunidade. Não
sonhei com nada. Não há razões específicas para que lhes explique, queridos
fiéis, mas se não nos preocuparmos com os comentários maldosos nossa imagem
fica completamente distorcida. Quanto a mim, esse servo humilde do senhor,
tenho todo o direito de conservar o nome que prometi honrar com a escolha de a
Deus servir em todos os momentos de minha vida. Se estou convencido que esta
imagem está sendo deturpada, busco reverter o processo - toda essa verborréia
digna de um sacerdote que perdeu as rédeas da mula fora dita após a missa, o
comentário estava em toda comunidade, com interpretações as mais tresloucadas,
era preciso se explicar.
Ouvira, aquando passava à porta de loja de discos em Atenas Atéia, dizer
que o prefeito havia recebido telegrama de jornal importantíssimo na capital,
dizendo que não mais lhe seria aceite a participação, agradeciam os privilégios
tão gentilmente concedidos, mas a partir daquela data considerasse de fora.
Nervoso, quisera logo saber a razão, pedindo a secretária que fizesse a
ligação, assim que conseguisse falar com o diretor da sessão que participava
dela, passasse a ligação. Não fora difícil encontrar o diretor, havia acabado
de chegar do almoço. A secretária cumpriu o pedido com glória.
Não sabia o porquê de haver se lembrado a secretária, aquando recebera
as ordens do prefeito para localizar o diretor do jornal, da piada que acabara
de ouvir de um papagaio. O telefone tocou na delegacia e ouviu-se voz
desesperada:
- Socorro, venham rápido! Um gato acaba de entrar em minha casa!
- Um gato?
- Isso.
- Bicho.
- Isso.
- Não fique apavorado. Não precisa se preocupar por causa de um gato –
disse-o, insinuando que já compreendia o que se sucedia, estava falando com um
homossexual tresloucado e sensível.
- É caso de vida ou morte!
- Mas... quem está falando? – assustou-se o delegado com o tom de medo
com que a voz dizia aquilo de vida ou morte. Não podia ser homossexual. Estava
brincando em serviço e a coisa era séria, seriíssima.
- É o papagaio.
(**RIO DE JANEIRO**, 04 DE MARÇO DE 2017)
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