**OU... OU... - ODE A KIERKEGAARD - II PARTE** - PINTURA: Graça Fontis/PROSA POÉTICA: Manoel Ferreira Neto


Ou as estrelas cintilando no céu, iluminando os becos e terrenos baldios, inspirando boêmios, andarilhos, poetas aos devaneios poéticos ou a noite sem lua, sem estrelas, a terra nas brumas, fazendo as criaturas refletirem sobre os traumas, conflitos, dores e sofrimentos, despautérios e mazelas, insones madrugada a fora, mas no alvorecer o des-abrochar das flores que são paliativos para as fugas e medos. Ou sentir o gosto saboroso do néctar dos deuses com pedrinhas de gelo, com direito a todos os devaneios, palavrinhas escritas no diário, à moda dos adolescentes que conheceram a primeira paixãozinha ou a manguaça de botequim, descendo a garganta queimando, o estômago re-clamando, ademais sabendo que a vida será mui breve, vítima de cirrose, de outras doenças, neuroses, os escândalos e violências despropositados. Ou todos os verbos rasgados euforicamente contra si mesmo devido às canalhices, viperinidades, ausência de amor, solidariedade, fraternidade, compaixão ou todas as rasgações de seda a favor por seriedade, sinceridade, honestidade aos princípios da vida que são sempre o encontro com o ser. Ou a sombra nas calçadas, amenizando os raios de sol que fazem suar, dão tonteiras, causam enfartos, derrames cerebrais, ou o sol de rachar, cozinhar os miolos. Ou a felicidade efêmera, aos poucochitos, às cavalitas, que abre outras possibilidades para outras conquistas e realizações ou a felicidade eterna que causa tédio, angústia, alfim os homens não conseguem con-viver com ela. Ou as sinas, as sagas, as desgraças, as tragédias que são húmus para re-pensar, meditar, re-fletir os mistérios que elas envolvem ou a ec-sistência de nada, de vazios, de náuseas, con-sentindo os enigmas. Ou ser poeta de versos e estrofes sensíveis, neles a presença da espiritualidade fundamentada de fé, sonho, esperanças, das linguísticas do pleno, semânticas do in-finito e do eterno, sintagmas das con-tingências ou não escrever única linha porque não é a verdade que habita os inter-ditos da alma. Ou sentir que quanto mais se anda mais estradas se re-velam à frente, com a-clives, de-clives, curvas, abismos, chapadões ou estagnar numa vendinha à beira, jogando cartas, bebendo, pois que não cansa tanto, não dá aquela sensação de que não há término delas. Ou verter as mais pujantes lágrimas devido aos fracassos, frustrações, que são as luzes que iluminam a cor-agem e a determinação para o desejo da superação e suprassunção ou rir a bandeiras soltas devido às mequetrefias, tramóias, trambiques, iniquidades, obtusidades. Ou o vazio que re-colhe e a-colhe o múltiplo, aí a vida resplende-se de outras luzes, horizontes, uni-versos, ou a náusea contínua do mundo, da ec-sistência, da vida, que levam, não restarem dúvidas, aos sete palmos debaixo da terra. Ou enfrentar os dilemas, contradicções, dialécticas da vida, de peito aberto, de cabeça erguida ou entregar-se aos dogmas e preceitos das religiões, das seitas religiosas que tripudiam com as ideologias e interesses escusos como sendo as verdades que levarão ao encontro de Deus, do Paraíso Celestial. Ou o nada que abre os leques da liberdade em todas as dimensões, em todos os níveis, faz o destino, o "eu histórico", "eu poético", "eu filosófico", ou o tudo que fecha todas as janelas, porteiras, cancelas, portas para as verdades.
Como céptico e ateu, prefiro prosseguir a estrada sempre com os olhos fixos na Colina dos Insurrectos, onde há sempre a visão do outro lado da meia-noite, que acaba de se pres-ent-ificar.



(**RIO DE JANEIRO**, 09 DE MARÇO DE 2017)


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